POÉTICA DO COTIDIANO

Textos, Frases, Cartas, Poemas, Canções, Diálogos, Interrogações... Todas as palavras que preenchem o nosso dia-a-dia... com muita poesia!

domingo, junho 17, 2012

ELA VOLTOU


Para minha querida amiga Vivi Lima.

            Certo dia, bati a sua porta e ela não atendeu. Insisti, nada. Desci a escada, sentei no meio fio, esperei meia hora. Voltei, bati e nada. Liguei, não atendeu. Será que viajou? Mas, assim? Sem avisar? Nenhum recado, e-mail, torpedo. Nada.
            Voltei três dias depois. Nada. Escrevi um e-mail. Esperei uma semana pela resposta. Nenhuma. Procurei os amigos em comum. Ninguém sabia. Nem mesmo o Carlos. Viajara? Adoecera? Resolveu experimentar um período sabático? Nenhuma resposta.
            Aborreceu-se? Pensei tanta coisa. Não, não havia motivos. Havia amizade, de fato? Claro! Como pude indagar isso? Amizade sente-se no coração. E a nossa amizade era indubitável.
            Então, esperei.
            Um mês, dois, três, sete meses. Um ano. Um ano e meio. Dois anos.
            Esqueci. Dei-me por vencida.
            Quarta feira de cinzas. Descansava em casa, ouvia Vander Lee para desanuviar a mente das marchinhas de carnaval:
“Não, que falte amor
No tempo, no espaço a gente ainda pode criar
Deixo a vida te levar
Que as luzes se acendam e que a gente possa brilhar...”
            Batem à porta. Não quero atender. Preguiça de levantar. Espero.
            Insistem nas batidas. Levanto me arrastando. Abro a porta.
            Vejo uma silhueta virada de costas, já descendo as escada. Digo oi. Ela vira. Quase não acredito. Será uma visão?
- Você?
- Sim... Voltei.
(Silêncio).
Nos abraçamos. Lágrimas escorreram dos nossos olhos.
- Amiga, queria pedir desculpas... Esse tempo todo...
- Desculpas? – Não é necessário. Tempo? Quanto tempo? Alías, o que é o tempo senão uma ilusão?
Você voltou. É só o que importa.


26.02.2012



sexta-feira, junho 08, 2012

ONDE TUDO SE PERDEU?


         Eram 6 da tarde quando ela ligou. Os ponteiros em linha reta dividiam ao meio o relógio cor de prata da cozinha. Mesmo sem olhar a identificação, depois do “Alô” já sabia que era ela, era a única que me chamava por uma sigla, arrastando ao máximo a segunda letra:

- Como você está?
- Tô meio assim, meio deprê, meio entediado.
- Deve ser o tempo, o tempo chuvoso nos deixa assim... (e começou a falar dessas coisas, poesias e filosofias que ela tanto gostava). - Você não acha Jotaerrêeeeeeeeeeeeeeeeee?
- Anh? ... (eu não havia ouvido tudo o que dissera, as coisas que ela falava me levavam sempre para longe dela, me faziam viajar... Saturno, Anéis, Oceanos... eu me perdia). - Sim, acho que sim.

         Não me lembro direito por onde continuou a conversa e nem como chegamos aqui, só lembro quando ela falou:

- Mas, eu não ficaria com nenhum dos seus amigos (senti um tom diferente na voz dela).
- E, por quê?
- Por que se tivesse que ficar com alguém da sua turma seria com você. Durante algum tempo mantive essa esperança, tínhamos muito a ver, mesmas músicas, programas, reggaes, bebidas... mas, fomos ficando muito amigos, não que isso me incomodasse, mas senti você se afastando...
- Não, não foi bem assim...
- Não, precisa se desculpar, talvez tivesse que ser assim... (e voltou de novo a falar das coisas filosóficas, poéticas e esotéricas que ela tanto gostava e eu voltei a me perder).

         Mas, dessa vez não fui para longe dela, fui para um tempo atrás, o tempo em que nós éramos mais próximos, como ela mesmo falou. O tempo em que gostava de admirar o riso fácil dela e de ouvirmos músicas juntos no carro, com ela cantarolando baixinho, de um jeito tímido... E pensei alto:

- Onde tudo se perdeu?
- Não sei, Jotaerrêeeeeee, não sei... Você tem bebido?
- Um pouco... vez em quando. Mas você, pelo que eu sei, tem bebido bastante, né?
- Sim, tenho, tenho bebido muito... Mas, a questão de beber muito é uma só: "a Vida não faz sentido". Cada dia menos sentido. Por isso, eu bebo e pelo menos agora, a vontade é de beber bebidas alcoólicas e não veneno.